CASOS DO CHICO



CASOS DO CHICO

Chico Xavier visitou durante muitos anos um jovem que tinha o corpo totalmente deformado e que morava num barraco à beira de uma mata. O estado de alienado mental era completo. A mãe deste jovem era também muito doente e o Chico a ajudava a banhá-lo, alimentá-lo e a fazer a limpeza do pequeno cômodo em que moravam.


O quadro era tão estarrecedor que, numa de suas visitas em que um grupo de pessoas o acompanhava, um médico perguntou ao Chico:

- Nem mesmo neste caso a eutanásia seria perdoável?

- Não creio, doutor, respondeu-lhe o Chico. Este nosso irmão, em sua última encarnação, tinha muito poder. Perseguiu, prejudicou e com torturas desumanas tirou a vida de muitas pessoas. Algumas o perdoaram, outras não e o perseguiram durante toda a sua vida. Aguardaram o seu desencarne (sic) e, assim que ele deixou o corpo, eles o agarraram e o torturaram de todas as maneiras durante muitos anos. Este corpo disforme e mutilado representa uma bênção para ele. Foi o único jeito que a Providência Divina encontrou para escondê-lo de seus inimigos. Quanto mais tempo aguentar, melhor será. Com o passar dos anos, muitos de seus inimigos o terão perdoado. Outros terão reencarnado. Aplicar a eutanásia seria devolvê-lo às mãos de seus inimigos para que continuassem a torturá-lo.

- E como resgatará ele seus crimes? Inquiriu o médico.

- O Irmão X costuma dizer que Deus usa o tempo e não a violência.

NO PLANO DOS SONHOS/Trecho do Livro Missionários da Luz/Chico Xavier/Pelo Espírito Andre Luiz


No plano dos sonhos

Após alguns minutos de conversação encantadora, o Irmão
Francisco acercou-se do orientador, indagando sobre os objetivos
da reunião da noite.
– Sim – esclareceu Alexandre, afável –, teremos algum trabalho
de esclarecimento geral a amigos nossos, relativamente a
problemas de mediunidade e psiquismo, sem minúcias particulares.
– Se nos permite – tornou o interlocutor –, estimaria trazer
alguns companheiros que colaboram freqüentemente conosco.
Seria para nós grande satisfação vê-los aproveitando os minutos
de sono físico.
– Sem dúvida. Destina-se o serviço de hoje à preparação de
cooperadores nossos, ainda encarnados na Crosta. Estaremos à
sua disposição e receberemos seus auxiliares com alegria.
Francisco agradeceu sensibilizado e perguntou:
– Poderemos providenciar?
– Imediatamente – explicou o instrutor, sem hesitação – conduza
os amigos ao sítio de seu conhecimento.
Afastou-se o grupo de socorristas, deixando-me verdadeiro
mundo de pensamentos novos. Segundo informações anteriores,
Alexandre dirigiria, naquela noite, pequena assembléia de estudiosos
e, assim que nos vimos a sós, explicou-me, solícito:
– Nosso núcleo de estudantes terrestres já possui certa expressão
numérica; no entanto, faltam-lhe determinadas qualidades
essenciais para funcionar com pleno proveito. Em vista disso,
imprescindível dotar os companheiros de conhecimentos mais
construtivos.
E, como julgasse útil fornecer-me informações pessoais destinadas
a minha própria elucidação, acrescentou, gentilmente:
– E os irmãos que comparecem – indaguei, curioso – conservam
a recordação integral dos serviços partilhados, de estudos
levados a efeito e observações ouvidas?
Alexandre pensou um momento e considerou:
– Mais tarde, a experiência mostrará a você como é reduzida
a capacidade sensorial.
O homem eterno guarda a lembrança completa e conserva consigo todos os ensinamentos, intensificando-os e valorizando-os, de acordo com o estado evolutivo que lhe é próprio.
O homem físico, entretanto, escravo de limitações necessárias, não pode ir tão longe.
O cérebro de carne, pelas injunções da luta a que o Espírito foi chamado a viver, é aparelho de potencial reduzido, dependendo muito da iluminação de seu detentor, no que se refere à fixação de determinadas bênçãos
divinas.
Desse modo, André, o arquivo de semelhantes reminiscências,
no livro temporário das células cerebrais, é muito diferente
nos discípulos entre si, variando de alma para alma.
Entretanto,cabe-me acrescentar que, na memória de todos os irmãos de
boa vontade, permanecerá, de qualquer modo, o benefício, ainda
mesmo que eles, no período de vigília, não consigam positivar a
origem.
As aulas, no teor daquela a que você assistirá nesta noite,
são mensageiras de inexprimíveis utilidades práticas.
Em despertando, na Crosta, depois delas, os aprendizes experimentam alívio,repouso e esperança, a par da aquisição de novos valores educativos.
É certo que não podem reviver os pormenores, mas guardarão
a essência, sentindo-se revigorados, de inexplicável maneira
para eles, não só a retomar a luta diária no corpo físico, mas também
a beneficiar o próximo e combater, com êxito, as próprias
imperfeições.
Seus pensamentos tornam-se mais claros, os senti
mentos mais elevados e as preces mais respeitosas e produtivas,
enriquecendo-se-lhes as observações e trabalhos de cada dia.
– É lastimável – disse eu, valendo-me de pausa mais longa –
que todos os membros do grupo não possam freqüentar, em massa,
as instruções dessa natureza.
Seria de extraordinária significação o ato de se congregarem mais de trezentas pessoas para os mesmos fins santificantes, recebendo, em conjunto, sublimes bênçãos de iluminação.
– Sem dúvida – redargüiu o orientador, no otimismo de sempre.
– No entanto, não podemos violentar ninguém.
Toda elevação representa uma subida e toda subida pede esforço de ascensão. Se os nossos amigos não se aproveitam da força que lhes é peculiar, se menosprezam os seus próprios direitos divinos, por olvidarem e por vezes detestarem os sagrados deveres que o Pai lhes confiou,
como operar por eles, se constitui lei primordial da vida a realização
divina e eterna para cada um de nós?
A observação era profunda e indiscutível.
Há esse tempo, defrontáramos vasto edifício que impressionava
pelas linhas modestas, embora transbordantes de luz.
– Vamos agora ao trabalho! – convocou Alexandre, resoluto.
– Mas – objetei por minha vez – não se efetuarão as aulas, na
sede do agrupamento onde se processam os serviços a seu cargo?
– Se o trabalho – respondeu ele, atencioso – fosse puramente
consagrado às entidades libertas do corpo material, poderíamos
desenvolver os nossos esforços, ali mesmo, com o maior êxito,
mas, no presente caso, devemos atender a irmãos ainda encarnados,
que vêm até nós em condições especialíssimas, e precisamos
aproveitar os recursos magnéticos dos amigos que ainda se encontram
igualmente em luta na Terra.
E chegados diante da porta de entrada, onde se movimentava
grande número de companheiros de nosso plano, o instrutor explicou:
– Temos aqui uma nobre instituição espiritista, a serviço dos
necessitados, dos tristes, dos sofredores.
O sagrado espírito de família evangélica permanece vivo nesta casa de amor cristão que o Espiritismo ergueu, por intermédio de uma venerável missionária do Cristo.
Nossos trabalhos se desdobrarão aqui com mais
eficiência, relativamente aos fins a que se destinam.
– Como é interessante – acentuei – o fato de necessitarmos
dos ambientes domésticos para instruções aos companheiros
encarnados!
– Sim – comentou Alexandre, com elevada sabedoria –, você
não pode esquecer que grandes ensinamentos do próprio Mestre
foram ministrados no seio da família.
A primeira instituição visível do Cristianismo foi o lar pobre de Simão Pedro, em Cafarnaum.
Uma das primeiras manifestações de Nosso Senhor, diante
do povo, foi a multiplicação das alegrias familiares, numa festa de
núpcias em pleno aconchego do lar.
Muitas vezes visitou Jesus as casas residenciais de pecadores confessos, acendendo novas luzes nos corações.
A última reunião com os discípulos verificou-se no
cenáculo doméstico.
O primeiro núcleo de serviço cristão em
Jerusalém foi ainda a moradia simples de Pedro, então transformado
em baluarte inexpugnável da nova fé.
Inegavelmente, todo templo de pedra, dignamente superintendido, funciona qual farol no seio das sombras, indicando os caminhos retos aos navegantes do mundo, mas não podemos esquecer que o movimento vital das idéias e realizações baseia-se na igreja viva do espírito, no coração
do povo de Deus.
Sem adesão do sentimento popular, na esfera da crença vivida no âmago de cada um, qualquer manifestação religiosa reduz-se a mero culto externo.
Por isso mesmo.
André, no futuro da Humanidade, os templos materiais do Cristianismo estarão transformados em igrejas-escolas, igrejas orfanatos,igrejas-hospitais, onde não somente o sacerdote da fé veicule a palavra de interpretação, mas onde a criança encontre arrimo e esclarecimento, o jovem a preparação necessária para as realizações dignas do caráter e do sentimento, o doente o remédio salutar, o ignorante a luz, o velho o amparo e a esperança.
O Espiritismo evangélico é também o grande restaurador das antigas igrejas apostólicas, amorosas e trabalhadoras.
Seus intérpretes fiéis serão auxiliares preciosos na transformação dos parlamentos
teológicos em academias de espiritualidade, das catedrais de pedra em lares acolhedores de Jesus.
Daria tudo o que estivesse ao meu alcance para continuar ouvindo as encantadoras elucidações do orientador, mas, nesse instante, transpúnhamos o limiar.
Verifiquei que faltavam apenas cinco minutos para duas horas
da madrugada.
Pelo grande número de entidades que vieram céleres ao nosso
encontro, percebi que havia enorme interesse em torno da palestra
instrutiva da noite.
Não se achavam presentes apenas os aprendizes
ligados ao esforço de Alexandre, em sentido direto, mas também
outros amigos, trazidos até ali por afeiçoados do plano espiritual.
Acercou-se de nós, com mais intimidade, pequeno grupo de
companheiros, destacando-se um deles que conversou com Alexandre,
de maneira mais significativa.
– Ainda não chegaram todos? – indagou o instrutor, com interesse
afetivo, após trocarem as primeiras impressões.
Percebi claramente que se referia aos irmãos encarnados que
deveriam comparecer na cota de freqüência do grupo de que era
ele um dos diretores espirituais.
– Faltam-nos apenas dois companheiros – elucidou o interpelado.
– Até o momento, Vieira e Marcondes ainda não chegaram.
– Urge iniciar os trabalhos – exclamou Alexandre, sem afetação
– devemos terminar a tarefa às quatro horas no máximo.
E, mostrando singular interesse de amigo, acrescentou:
– Quem sabe se foram vítimas de algum acidente? Convém
positivar no espírito de calma decisão que lhe é característico,
recomendou ao auxiliar que lhe prestava informações:
– Sertório, enquanto vou ultimar algumas providências para
as instruções da noite, observe o que se passa.
Respeitoso, o subordinado interrogou:
– Caso estejam os nossos irmãos sob a influência de entidades
criminosas, como devo proceder?
– Deixá-los-á, então, onde estiverem – replicou o instrutor,
resoluto –; o momento não comporta grandes conversações com
os que se prendem, deliberadamente, ao plano inferior.
Findo o trabalho, você mesmo providenciará os recursos que se façam
necessários.
Dispunha-se o mensageiro a partir, quando o orientador, percebendo-
me o ardente interesse em acompanhá-lo, acrescentou:
– Se deseja, André, poderá seguir, colaborando com o emissário
em serviço, Sertório terá prazer em sua companhia.
Agradeci extremamente satisfeito e abracei o auxiliar de Alexandre,
que me sorriu acolhedoramente.
Saímos.
Era indispensável atender o mandado com presteza; todavia,
satisfazendo-me a curiosidade, Sertório explicou, generoso:
– Quando encarnados, na Crosta, não temos bastante consciência
dos serviços realizados durante o sono físico; contudo, esses
trabalhos são inexprimíveis e imensos.
Se todos os homens prezassem
seriamente o valor da preparação espiritual, diante de semelhante gênero de tarefa, certo efetuariam as conquistas mais brilhantes, nos domínios psíquicos, ainda mesmo quando ligados aos envoltórios inferiores.
Infelizmente, porém, a maioria se vale,
inconscientemente, do repouso noturno para sair à caça de emoções
frívolas ou menos dignas.
Relaxam-se as defesas próprias, e certos impulsos, longamente sopitados durante a vigília, extravasam em todas as direções, por falta de educação espiritual, verdadeiramente
sentida e vivida.
Interessado em esclarecimentos completos. Indaguei:
– Entretanto, isto ocorre com aprendizes de cursos avançados
do Espiritualismo? Poderiam ser vítimas desses enganos alunos de
um instrutor da ordem de Alexandre?
– Como não? – tornou Sertório, fraternalmente. – Com referência
a essa probabilidade, não tenha qualquer dúvida. Quantos
pregam a Verdade, sem aderirem intimamente a ela?
Quantos repetem fórmulas de esperança e paz, desesperando e perseguindo, no fundo do coração?
Há sempre muitos “chamados” em todos os setores de construção e aprimoramento do mundo! Os “escolhidos”, contudo, são sempre poucos.
Completando o pensamento, como a escoimá-lo de qualquer
falsa noção de particularismos na obra divina, Sertório acrescentou:
– E precisamos reajustar nossas definições sobre os “escolhidos”.
Os companheiros assim classificados não são especialmente
favorecidos pela graça divina, que é sempre a mesma fonte de
bênçãos para todos.
Sabemos que a “escolha”, em qualquer trabalho construtivo, não exclui a “qualidade”, e se o homem não oferece qualidade superior para o serviço divino, em hipótese alguma deve esperar a distinção da escolha.
Infere-se, pois, que Deus chama todos os filhos à cooperação em sua obra augusta, mas somente os devotados, persistentes, operosos e fiéis constroem qualidades eternas que os tornam dignos de grandes tarefas.
E,reconhecendo-se que as qualidades são frutos de construções
nossas, nunca poderemos esquecer que a escolha divina começará
pelo esforço de cada um.
A tese do companheiro era assaz interessante e educativa,
mas havíamos atingido pequeno edifício, em frente do qual Sertório
se deteve e falou:
– É a residência de Vieira. Vejamos o que se passa.
Acompanhei-o em silêncio.
Em poucos instantes, encontrávamo-nos dentro de quarto
confortável, onde dormia um homem idoso, fazendo ruído singular.
Via-se-lhe, perfeitamente, o corpo perispirítico unido à forma
física, embora parcialmente desligados entre si.
Ao seu lado, permanecia uma entidade singular, trajando vestes absolutamente negras.
Notei que o companheiro adormecido permanecia sob
impressões de doloroso pavor. Gritos agudos escapavam-lhe da
garganta. Sufocava-se, angustiadamente, enquanto a entidade
escura fazia gestos que eu não conseguia compreender.
Sertório acercou-se de mim e observou:
– Vieira está sofrendo um pesadelo cruel.
E indicando a entidade estranha:
– Creio que ele terá atraído até aqui o visitante que o espanta.
Com efeito, muito delicadamente, o meu interlocutor começou
a dialogar com a entidade de luto:
– O amigo é parente do companheiro que dorme?
– Não, não. Somos conhecidos velhos.
E. muito impaciente, acentuou:
– Hoje, à noite, Vieira me chamou com as suas reiteradas
lembranças e acusou-me de faltas que não cometi, conversando
levianamente com a família. Isso, como é natural, desgostou-me.
Não bastará o que tenho sofrido, depois da morte?
Ainda precisarei ouvir falsos testemunhos de amigos maledicentes? Não poderia esperar dele semelhante procedimento, em virtude das relações
afetivas que nos uniam as famílias, desde alguns anos. Vieira foi
sempre pessoa de minha confiança.
Em razão da surpresa, deliberei esperá-lo nos momentos de sono, a fim de prestar-lhe os necessários esclarecimentos.
O estranho visitante. Todavia, fez uma pausa, sorriu irônico, e
continuou:
– Entretanto, desde o momento em que me pus a explicar-lhe
a situação do passado, informando-o quanto aos verdadeiros
móveis de minhas iniciativas e resoluções na vida carnal, para que
não prossiga caluniando-me o nome, embora sem intenção, Vieira
fez este rosto de pavor que estão vendo e parece não desejar ouvir
as minhas verdades.
Interessado nas lições novas, aproximei-me do amigo, cujo
corpo descansava em posição horizontal, e senti-lhe o suor frio
ensopando os lençóis.
Não revelava compreender convenientemente o auxílio que
lhe era trazido, fixando-nos com estranheza e ansiedade, intensificando,
ainda mais, os gemidos gritantes que lhe escapavam da
boca.
Sentindo a silenciosa reprovação de Sertório, o habitante das
zonas inferiores dirigiu-lhe a palavra de modo especial:
– O senhor admite que devamos ouvir impassíveis os remoques
da leviandade?
Não será passível de censura e punição o amigo infiel que se vale das imposições da morte para caluniar e deprimir?
Se Vieira sentiu-se no direito de acusar-me, desconhecendo certas particularidades dos problemas de minha vida privada,não é justo que me tolere os esclarecimentos até ao fim?
Não sabe ele, acaso que os mortos continuam vivos?
Ignorará, porventura, que a memória de cada companheiro deve ser sagrada? Ora esta! Eu mesmo já lhe ouvi, em minha nova condição de desencarnado, longas dissertações referentes ao respeito que devemos
uns aos outros... Não considera, pois, que tenho motivos justos
para exigir um legítimo entendimento?
O interpelado esboçou um gesto de complacência e observou:
– Talvez esteja com a razão, meu caro. Entretanto, creio deva
desculpar seu amigo! Como exigir dos outros conduta rigorosamente
correta, se ainda não somos criaturas irrepreensíveis? Tenha
calma, sejamos caridosos uns para com os outros!...
E, enquanto a entidade se punha a meditar nas palavras ouvidas.
Sertório falou-me em tom discreto:
– Vieira não poderá comparecer esta noite aos trabalhos.
Não pude reprimir a má impressão que a cena me causava e,
talvez porque eu fizesse um olhar suplicante, advogando a causa
do pobre irmão, quase a desencarnar-se de medo, o auxiliar de
Alexandre prosseguiu:
– Retirar violentamente a visita, cuja presença ele próprio
propiciou, não é tarefa compatível com as minhas possibilidades
do momento. Mas podemos socorrê-lo, acordando-o.
E, sem pestanejar, sacudiu o adormecido, energicamente, gritando-
lhe o nome com força.
Vieira despertou confuso, estremunhando, sob enorme fadiga,
e ouvi-o exclamar, palidíssimo:
– Graças a Deus, acordei! Que pesadelo terrível!... Será crível
que eu tenha lutado com o fantasma do velho Barbosa? Não! Não
posso acreditar!...
Não nos viu, nem identificou a presença da entidade enlutada,
que ali permaneceu até não sei quando.
E, ao retirarmo-nos, ainda lhe notei as interrogações íntimas, indagando de si mesmo sobre o que teria ingerido ao jantar, tentando justificar o susto cruel com pretextos de origem fisiológica.
Longe de auscultar a própria consciência, com respeito à maledicência e à leviandade, procurava materializar a lição no próprio estômago, buscando furtar-se à realidade.
Sertório, porém, não me proporcionou ensejo a maiores reflexões.
Convocando-me ao dever imediato, acrescentou:
– Visitemos o Marcondes. Não temos tempo a perder.
Daí a dois minutos, penetrávamos outro apartamento privado;
todavia, o quadro agora era muito mais triste e constrangedor.
Marcondes estava, de fato, ali mesmo, parcialmente desligado
do corpo físico, que descansava com bonita aparência, sob as
colchas rendadas.
Não se encontrava ele sob impressões de pavor,como acontecia ao primeiro visitado; entretanto, revelava a posição de relaxamento, característica dos viciados do ópio.
Ao seu lado, três entidades femininas de galhofeira expressão permaneciam em atitude menos edificante.
Vendo-nos, de súbito, o dono do apartamento surpreendeu-se,
de maneira indisfarçável, mormente em fixando Sertório, que era
de seu mais antigo conhecimento. Levantou-se, envergonhado, e
ensaiou algumas explicações com dificuldade:
– Meu amigo – começou a dizer, dirigindo-se ao auxiliar de
Alexandre –, já sei que vem procurar-me... Não sei como esclarecer
o que ocorre...
Não pôde, contudo, prosseguir e mergulhou a cabeça nas
mãos, como se desejasse esconder-se de si mesmo.
A essa altura da cena constrangedora, verifiquei, então, sem
vislumbres de dúvida, que as entidades visitantes eram da pior
espécie, de quantas conhecia eu nas regiões das sombras.
Irritadas talvez com o recuo do companheiro, que se revelava
triste e humilhado, prorromperam em grande algazarra, acercando-
se mais intensamente de nós, sem o mínimo respeito.
– Impossível que nos arrebatem Marcondes! – disse uma delas,
enfaticamente, – Afinal de contas, vim de muito longe para
perder meu tempo assim, sem mais nem menos!
– Ele mesmo nos chamou para a noite de hoje – exclamou a
segunda, atrevidamente – e não se afastará de modo algum.
Sertório ouvia com serenidade, evidenciando íntima compaixão.
A terceira entidade, que parecia reter instintos inferiores mais
completos, aproximou-se de nós com terrível expressão de sarcasmo
e falou, dando-me a entender que aquela não era a primeira
vez que Sertório procurava o sitio para os mesmos fins e nas
mesmas circunstâncias:
– Os senhores não passam de intrusos. Marcondes é fraco,
deixando-se impressionar pela presença de ambos. Nós, todavia,
faremos a reação. Não conseguirão arrancar-nos o predileto.
E gargalhando, irônica, acentuava:
– Também temos um curso de prazer. Marcondes não se afastará.
Contrariamente aos meus impulsos, Sertório não demonstrava
a mínima atenção. As palavras e expressões daquela criatura,
porém, irritavam-me.
Ao meu lado, o auxiliar de Alexandre mantinha-se extremamente
bondoso. A própria vítima permanecia humilde e triste.
Porque semelhantes insultos?
Ia responder alguma coisa, no sentido de esclarecer o caso em
termos precisos, quando Sertório me deteve:
– André, contenha-se! Um minuto de conversação atenciosa
com as tentações provocadoras do plano inferior pode induzir-nos
a perder um século.
Em seguida, com invejável tranqüilidade, dirigiu-se ao interessado,
perguntando, sem espírito de censura:
– Marcondes, que contas darei hoje de você, meu amigo?
O interpelado respondeu, lacrimoso e humilhado:
– Oh, Sertório, como é difícil manter o coração nos caminhos
retos! Perdoe-me... Não sei como isto aconteceu... Não posso
explicar-me!
Mas Sertório parecia pouco disposto a cultivar lamentações e.
mostrando-se muito interessado em aproveitar o tempo, interrompeu-
o:
– Sim. Marcondes. Cada qual escolhe as companhias que prefere.
Futuramente você compreenderá que somos seus amigos
leais e que lhe desejamos todo o bem.
Despejaram as mulheres nova série de frases ridicularizadoras.
Marcondes começou, de novo, a lastimar-se, mas o mensageiro
de Alexandre, sem hesitar, tomou-me a destra e regressamos à
via pública.
– Voltemos imediatamente – disse ele, decidido.
– E em que ficamos? – indaguei – não vai acordá-lo?
– Não. Não podemos agir aqui do mesmo modo. Marcondes
deve demorar-se em tal situação, para que amanhã a lembrança
desagradável seja mais duradoura, fortificando-lhe a repugnância
pelo mal.
– Que fazer, então? – perguntei, espantado.
– Diremos ao nosso orientador o que ocorre – redargüiu Sertório,
calmamente – é o que nos cabe levar a efeito.
E, sintetizando longas considerações que poderia expender relativamente
ao assunto, frisou:
– Por agora, André, chama-nos o dever mais alto, no campo
de nossa jornada para Deus. Entretanto, quando terminarem as
instruções da noite, voltarei a ver o que é possível efetuar em
favor de nossos pobres amigos. No momento, não devemos perder
os minutos. As preleções de Alexandre não se destinam somente
ao preparo dos nossos irmãos que ainda se ligam aos envoltórios
de carne, na superfície da Crosta; são igualmente valiosas para
nós outros, que necessitamos enriquecer possibilidades para socorrer,
com êxito, os companheiros encarnados.
– Sim, concordo – respondi. – No entanto, a situação de Vieira
e Marcondes sensibiliza-me fundamente.
Sertório, porém, cortou-me a palavra, rematando, seguro de si
mesmo:
– Conserve seu sentimento, que é sagrado; não se arrisque,
porém, a sentimentalismo doentio. Esteja tranqüilo quanto à assistência,
que não lhes faltará no momento oportuno; não se esqueça,
porém, de que, se eles mesmos algemaram o coração em semelhantes
cárceres, é natural que adquiram alguma experiência
proveitosa à custa do próprio desapontamento.''
(capítulo 8/Livro Missionários da Luz/Chico Xavier/pelo espírito Andre Luiz).

Vendo-se como uma criança

Se eu pegasse uma criança de três anos e a colocasse no meio da sala e nós começássemos a gritar com ela, dizendo-lhe que é burra, que nunca fará nada direito, que deve fazer isto ou aquilo, olhar para a bagunça que fez, talvez bater nela algumas vezes, terminaríamos com uma criancinha assustada, sentada docilmente num canto da sala, ou então com uma arrebentando todo o cômodo. Ela agirá de uma dessas duas maneiras e nunca saberemos qual é o seu verdadeiro potencial.
Agora, se pegarmos a mesma criança e lhe dissermos o quanto a amamos o quanto nos importamos com ela, que adoramos sua aparência e nos orgulhamos da sua esperteza e inteligência, que ficamos encantados com as coisas que faz e que ela pode cometer erros enquanto aprende - que estaremos sempre do seu lado tanto nas horas boas como ruins -, o potencial dessa criança será ilimitado.
Cada um de nós tem uma criança de três anos no nosso interior e com frequência passamos a maior parte de nossas vidas gritando com ela. Depois ficamos imaginando por que nossa vida não funciona.
Se você tivesse um amigo que vivesse criticando-o, gostaria de estar sempre com ele? É possível que você tenha sido tratado dessa forma quando criança, e isso é muito triste. No entanto, isso aconteceu muito tempo atrás. Se atualmente você está escolhendo se tratar da mesma forma, então é algo mais triste ainda.
Agora, bem à nossa frente, temos uma lista das mensagens negativas que ouvimos quando crianças. Como essa lista corresponde ao que você acredita estar errado com você? São quase as mesmas coisas? Provavelmente sim.
Baseamos nosso roteiro de vida em nossas mensagens de infância. Éramos todos bonzinhos e aceitamos obedientemente o que "eles" nos disseram como sendo verdade. Seria muito fácil só culparmos nossos pais e sermos vítimas pelo resto da vida, mas isso não teria graça nenhuma e com toda a certeza não nos tiraria da encrenca em que nos encontramos agora.
Culpando a família
A culpa é um dos modos mais garantidos de se permanecer dentre de um problema. Quando culpamos alguém, estamos abrindo mão do nosso poder. A compreensão nos permite elevarmo-nos acima da questão e assumirmos o controle de nosso futuro.
O passado não pode ser mudado. O futuro é moldado pelo pensamento atual. É imperativo para nossa liberdade entender que nossos pais estavam fazendo o máximo que podiam com a compreensão, consciência e sabedoria que tinham. Sempre que culpamos alguém, não estamos assumindo a responsabilidade por nós mesmos.
Aquelas pessoas que nos fizeram todas aquelas coisas horríveis estavam tão assustadas e amedrontadas como você está agora. Sentiam a mesma impotência que você sente agora. As únicas coisas que podiam ensinar eram as que tinham aprendido.
Quanto você sabe sobre a infância dos seus pais, especialmente antes dos dez anos de idade? Se ainda for Possível, descubra mais perguntando-lhes. Se conseguir mais informações sobre a infância de seus pais, você entender com maior facilidade por que fizeram o que fizeram. A compreensão resultará em compaixão.
Se você não sabe e não tem como descobrir, tente imaginar como deve ter sido. Que tipo de infância criaria um adulto como aquele?
Você Precisa desse conhecimento para sua própria libertação.
Você só poderá se libertar depois de libertá-los. Você só poderá se perdoar depois de perdoá-los. Se exigir perfeição deles, exigirá perfeição de si mesmo, o que o tornará infeliz a vida toda.
A escolha dos pais
Concordo com a teoria de que escolhemos nossos pais. As lições que aprendemos parecem combinar perfeitamente com as "fraquezas" dos pais que temos.
Acredito que estamos todos numa viagem interminável através da eternidade. Viemos a este planeta para aprendermos lições especiais necessárias para nossa evolução espiritual. Escolhemos nosso sexo, cor e país, e em seguida procuramos o casal perfeito para "refletir" nossos padrões.
Nossas visitas a este planeta são como ir a uma escola. Se você quer ser esteticista, você vai fazer um curso de estética. Se você quer ser um mecânico, vai para a escola de mecânica. Se você quer ser um advogado, vai para a faculdade de direito. Os pais que você escolheu nesta vida eram o casal perfeito de "peritos" no que você queria aprender.
Quando crescemos, temos a tendência de apontar um dedo acusador para os nossos pais e dizer: "Vocês me fizeram isso!" Porém, eu acredito que nós os escolhemos.
(Trecho do Livro ''Voce Pode Curar Sua Vida Louise Hay )
Programação Neurolinguistica/PNL/.